A tecnologia e a cultura de segurança na resiliência ao fogo

Fotografia: Paul Hanaoka_Unsplash

Profissionais de saúde e de proteção civil encheram o auditório do Hospital Pedro Hispano, no dia 26 de janeiro, para o primeiro Encontro Nacional dedicado ao tema, em contexto de unidades de saúde.

A escolha não parece ter sido deixada ao acaso: em 2022, Matosinhos foi a primeira cidade portuguesa a ser distinguida como “Resilient Hub”, no âmbito da campanha “Construindo Cidades Resilientes 2030”. Para este reconhecimento contribuíram estratégias de resiliência face a incêndios urbanos e florestais.

O exemplo de Matosinhos e do seu trabalho em rede foi, inclusive, reconhecido pela Secretária de Estado da proteção Civil na sessão de abertura. Mas Patrícia Gaspar sabe que há trabalho por fazer no país, e encara os números do anuário da proteção contra incêndios da ANEPC – cerca de nove mil incêndios urbanos anuais que, em 2022, resultaram em 44 mortos e 900 feridos – como um slow disaster. A governante espera, por isso, que não seja necessário ocorrer uma catástrofe da dimensão dos incêndios florestais de 2017 para mudar o sistema.

Onde ficam os hospitais?

Hospitais e lares de idosos enquadram-se na utilização-tipo (UT) V. É nas UT I (edifícios habitacionais) que ocorre a maioria dos incêndios urbanos – nas UT V registaram-se 45 em 2022 – mas tal não significa que não deva ser prestada uma atenção especial a estes edifícios. Talvez por isso, foi precisamente esta a categoria de utilização que registou o maior número de pedidos de inspeção regular em 2022 (373), mas para Luís Virote, arquiteto da Proteção Civil, ainda é necessário melhorar estes números e fazer dos edifícios de tipo V “uma referência para a segurança contra incêndio”, até pela fragilidade dos seus ocupantes. Na avaliação do arquiteto, falham medidas de autoproteção na fase de exploração do edifício, ainda que existam na fase de conceção.

De facto, os desafios num hospital são muitos – utentes internados ou com a sua autonomia limitada, exames e cirurgias a decorrer quando o incêndio deflagra ou armazenamento de materiais de risco. Por isso, como salientou José Aidos Rocha, da Exactusensu, na sua intervenção, importa proceder à compartimentação, com portas corta-fogo que segmentem o risco, e ter estratégias para fazer o deslocamento de doentes. Ainda que questões deste tipo sejam previstas pela legislação, para José Aidos Rocha as equipas experientes devem ir além destas formalidades e, logo na fase de projeto, definir espaços que possam ser usados em emergências e estratégias de evacuação.

Aqui, a tecnologia também pode ajudar. Foi essa a proposta de Telma Sousa, da Segeltec, a quem coube destacar as vantagens do recurso ao Building Information Modelling (BIM) na segurança contra incêndio. A elaboração de modelos 3D do edifício facilita a definição de rotas de evacuação e a análise e simulação de cenários de incêndio, para além de facilitar a manutenção e inspeção.

Coube a João Emílio Almeida, do ISTEC Porto, introduzir a gamificação como estratégia: o investigador tem trabalhado no desenvolvimento de “jogos sérios” para trabalhar cenários e planos de emergência, o que permite testar, de forma pouco intrusiva, sem disrupções no trabalho dos profissionais, cenários reais e não modelos. O sucesso da estratégia ainda está por comprovar, já que o investigador ainda não encontrou empresas com vontade de aplicar estas abordagens.

A cultura de segurança

A implementação de uma cultura de segurança foi um dos principais desafios apontados pelos responsáveis desta área dos diferentes hospitais que se fizeram representar – com exceção do anfitrião, que regista bons níveis de adesão à formação. Cláudia Vieira, da ULS de São João, começou por salientar que a formação ainda é vista como um requisito legal, quando é importante que seja vista como um requisito de funcionamento. Por isso, aquela unidade hospitalar tem optado por ações curtas e muito dirigidas aos profissionais de cada área, para aumentar níveis de adesão. Estas formações são complementadas com a disponibilização de vídeos curtos sobre técnicas de combate a incêndios.

Da ULS de Santo António veio um desafio particular: o seu edifício neoclássico classificado, onde foi feita comparticipação corta-fogo para ultrapassar as contingências arquitetónicas. A responsável da área, Sofia Pinheiro, vincou que o serviço de qualidade e segurança não consegue estar em todo o lado, pelo que é importante que as pessoas estejam sensibilizadas e prontas a reagir, o que nem sempre acontecem, nomeadamente quando ouvem o alarme e não saem, conforme testemunhou a responsável.

Por Cátia Vilaça

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