Pneumologistas do São João avaliam exposição ambiental dos utentes

  • 08 setembro 2023, sexta-feira
  • Gestão

Pneumologistas do Centro Hospitalar Universitário de São João (CHUSJ) querem avaliar a exposição ambiental dos utentes porque a humidade e o bolor podem ser “causas silenciosas” de doenças como a Pneumonite de Hipersensibilidade, patologia referenciada para transplante pulmonar.

“Quando o diabo mora dentro de casa” podia ser o resumo da investigação que os pneumologistas David Barros Coelho e António Morais estão a desenvolver e que visa avaliar a exposição ambiental dos utentes seguidos no CHUSJ.

Em causa está a identificação dos fungos aos quais os doentes estão expostos, fungos que são recolhidos diretamente nas habitações.

Em entrevista à agência Lusa, no Dia Mundial de Sensibilização para a Fibrose Pulmonar, David Barros Coelho descreveu que “se nota dificuldade por parte do utente e do clínico em identificar sinais de exposição a fungos”, mas os resultados preliminares desta investigação apontam que em 37 por cento dos casos foi encontrada exposição domiciliária apesar de não ter sido reportada pelo doente em consulta.

Acresce que cerca de 75 por cento dos doentes com Pneumonite de Hipersensibilidade são expostos a níveis tóxicos de fungos no seu domicílio.

“A Pneumonite de Hipersensibilidade é uma doença que, se virmos a população geral, é pouco comum, contudo dentro das doenças respiratórias, principalmente nas relacionadas com fibrose pulmonar, é uma das mais comuns. No nosso hospital o peso da doença está plasmado no facto de ser a doença referenciada para transplante pulmonar”, referiu David Barros Coelho.

O clínico descreveu que há causas “relativamente fáceis de identificar”, como a exposição a aves que acontece, por exemplo, com quem se dedica à columbofilia e criação de pombos, muitas vezes não se sabe a que é que está exposto o doente.

Segundo o clínico, as características do clima português, nomeadamente a Norte, um clima quente e húmido, também podem constituir condições favoráveis ao aumento do vapor de água que faz com que haja mais fungos no ar, principalmente dentro de casa, no entanto, frisou, “é necessário investigar”.

“Há um estudo da União Europeia que diz que Portugal é o segundo país que mais reporta a presença de humidade dentro de casa. Podemos tratar a doença, podemos dar imunossupressores ao doente, podemos dar antifibróticos, mas a pedra basilar é eliminar a exposição ao que está a causar a doença”, resumiu.

A Pneumonite de Hipersensibilidade é uma doença que se caracteriza por inflamação das vias respiratórias.

Esta patologia tem um impacto muito negativo na qualidade de vida, estando associada a uma elevada morbilidade e mortalidade e é considerada uma doença com elevados custos para o doente e para o sistema de saúde.

À agência Lusa, David Barros Coelho explicou que além de analisarem o ambiente interno e externo e as características do edifício e mobiliário, ou seja, observarem as manchas de humidade nas paredes, os bolores ou a condensação e a descoloração, a investigação incluiu a recolha de uma amostra de ar, isto com o objetivo de quantificar e identificar os fungos presentes nesse ambiente.

“Tentamos chegar ao inimigo invisível. Recolhemos uma amostra de ar, geralmente no quarto dos doentes – estamos a falar de doentes com 60 e 70 anos que têm alguma falta de ar – quantificámos e os resultados foram muitos expressivos. Quase três quartos dos doentes tinham exposição a níveis tóxicos de fungos”, descreveu.

Com esta investigação o CHUSJ quer sensibilizar a população, sobretudo os doentes de risco e fazer a sociedade e os decisores refletir nas medidas a tomar.

“Um dos objetivos é, em termos de saúde pública, refletirmos sobre o que está a causar esta doença e tentar alterar isso”, disse David Barros Coelho.

A avaliação ambiental domiciliária completa está a ser realizada pelo investigador em Saúde Pública, João Rufo.

Os pneumologistas alertam que a inalação persistente dos antigénios ambientais causa sintomas de dispneia, tosse ou cansaço, bem como alterações estruturais irreversíveis, podendo haver progressão para a fibrose pulmonar.

Os investigadores também alertam que doenças crónicas, como a asma ou a doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC), podem ficar agravadas e exigir mais terapêutica ou mesmo desencadear outros problemas pulmonares.

Campanha apela ao diagnóstico precoce da fibrose pulmonar

A campanha “Suspeito de Fibrose Pulmonar, Procura-se”, lançada a 7 de setembro, pretende alertar para uma doença rara que poderá ter uma progressão mais lenta, quanto mais precoce for o diagnóstico, disse o presidente da Sociedade Portuguesa de Pneumologia.

“A fibrose pulmonar existe e não é só uma doença, é um conjunto de doenças que têm a caraterística comum de serem doenças crónicas e progressivas. Com o devido tratamento a progressão é mais lenta e, como tal, é necessário fazer um diagnóstico precoce para aplicar a terapêutica também mais precocemente possível”, disse António Morais.

Em entrevista à agência Lusa, o presidente da Sociedade Portuguesa de Pneumologia alertou que a progressão nesta doença é irreversível, sublinhando o alerta para o diagnóstico precoce.

“Quando diagnosticamos, não conseguimos recuperar aquilo que o doente perdeu até ao momento em termos de função respiratória (...). Mas diagnosticar vai permitir que pelo menos a doença a partir daí tenha uma evolução mais lenta”, frisou.

Além de subdiagnosticada por falta de conhecimento, a Fibrose Pulmonar tem ainda sintomas inespecíficos.

Numa fase precoce da doença, os doentes têm uma diminuição ligeira da capacidade de esforço, o que ainda lhes permite autonomia e qualidade de vida.

Mas com a progressão, associada a uma diminuição daquela mesma capacidade e a uma sensação de asfixia, a limitação e a dependência têm tendência a ser cada vez mais acentuadas.

Esta é uma doença considerada “desafiante” tanto para os doentes, como para os familiares e cuidadores, uma vez que tarefas básicas do dia-a-dia, como caminhar pequenas distâncias, carregar pesos ou realizar tarefas domésticas apresentam grandes dificuldades para os doentes.

“Esta campanha destina-se a doentes, mas também a profissionais de saúde, de modo a que estejam atentos aos sintomas e não ignorem uma doença rara, mas que existe”, acrescentou o médico.

António Morais admitiu que quem se vê perante queixas pouco específicas ou muito abrangentes, possa primeiro pensar em outras doenças, aquelas doenças que são mais frequentes, mas pediu para continuarem “o estudo porque existem mais hipóteses”.

Num apelo dirigido a todos os profissionais de saúde, mas sobretudo aos médicos de família, o especialista pediu atenção a sintomas como tosse seca e cansaço.

António Morais indicou que dados internacionais apontam para o diagnóstico de 20 a 30 doentes por cada cem mil, por ano.

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