Resiliência sísmica do sistema de saúde

Na ocorrência de um sismo, hospitais e outros equipamentos de saúde são as estruturas mais críticas, assim como escolas e equipamentos de protecção civil, tais como quartéis de bombeiros e esquadras de polícia. O Risco Sísmico que afecta este tipo de estruturas depende da região onde estão localizadas. O risco sísmico de uma região é medido pelas perdas esperadas (materiais e humanas, directas ou indirectas) que os elementos dessa região sofrerão, como resultado de sismos futuros, e pela probabilidade de as mesmas ocorrerem para um certo tempo de exposição (Sousa, 2006 ). A mitigação do Risco Sísmico só pode ser efectuada se compreendermos os factores que o influenciam. Do ponto de vista cientifico, é comummente aceite que o Risco Sísmico depende de três factores (Sousa, 2006 ):

  1. A perigosidade, que pode ser entendida como a probabilidade de ocorrência de um sismo com uma dada intensidade.
  2. A exposição ou o valor dos elementos em risco (infra-estruturas, população, actividades económicas) e sua distribuição geográfica.
  3. A vulnerabilidade sísmica dos elementos expostos e extensão e grau da sua danificação, face à acção dos sismos.

Desta forma, é compreensível que a variação de qualquer dos três factores mencionados condicione a severidade do Risco Sísmico. Por exemplo, é razoável que uma dada região sujeita a sismos intensos, mas escassamente habitada, tenha um Risco Sísmico reduzido e que regiões diferentes, com exposição semelhante e sujeitas a sismos da mesma severidade, possuam riscos tanto mais elevados quanto mais vulneráveis forem as estruturas existentes (Sousa, 2006).

Como facilmente se compreende, e do ponto de vista pragmático, o único factor em que os engenheiros podem actuar para reduzir o Risco Sísmico é a Vulnerabilidade. Para atingir esse objectivo, é necessária a avaliação da construção com a consequente intervenção de reabilitação ou reforço nas estruturas existentes, e utilizando tecnologias e conhecimentos actuais no projecto das novas construções.

Em Portugal Continental, estudos recentes (Sousa, R.e all, 2018) evidenciam que o Risco Sísmico é elevado na zona metropolitana de Lisboa e no Algarve, sendo fundamental nestes locais, não só para as construções existentes como para as novas construções, que a Vulnerabilidade dessas construções seja minimizada ao máximo.

Neste sentido, devem ser disseminadas boas práticas construtivas sismo-resistentes, para se conseguir minimizar o Risco Sísmico em Portugal.

Os hospitais, dada a natureza da sua função, têm a responsabilidade de providenciar imediato tratamento ao elevado número de feridos provocados pela ocorrência de um sismo. 97 por cento dos feridos registam-se os primeiros 30 minutos após o primeiro choque. Este facto levou entidades como a Organização Mundial de Saúde a insistir que hospitais e outros equipamentos de saúde devem ser resilientes e capazes de manter a operacionalidade imediata para atendimento às populações atingidas pelo sismo.

No que diz respeito à localização dos hospitais em regiões de Risco Sísmico elevado, a Organização Mundial de Saúde recomenda que os hospitais não sejam construídos em certos locais, nomeadamente:

  1. – Na base de montanhas sujeitas a deslizamentos
  2. – Em cima ou próximo de falhas activas
  3.  - Em locais sujeitos a potenciais tsunamis

Muitas outras recomendações da Organização Mundial de Saúde podem ser encontradas na publicação Safe Hospitals in Emergencies and Disasters.

O actual código de protecção sísmica – Eurocódigo 8, define que os edifícios devem estar dimensionados de forma a:

  1. Evitar o colapso das estruturas, ou seja, proteger as vidas dos ocupantes;
  2. Limitar os danos dos elementos não estruturais;
  3. Manter a operacionalidade de hospitais e estruturas importantes da Protecção Civil.

Tem-se verificado, em sismos recentes, que edifícios dimensionados de acordo com as exigências acima mencionadas não atendem à operacionalidade imediata das estruturas referidas, pois os danos nos elementos não estruturais, assim como os danos nos equipamentos muito sensíveis que equipam os hospitais, impedem a sua utilização imediata.

Os sismos de Northridge (1994), Kobe (1995) e, mais recentemente, os sismos de Christchurch e Tôhoku (2011), vieram provar que os edifícios e hospitais protegidos com o sistema de isolamento de base se comportaram perfeitamente ao contrário de outros edifícios, que embora dimensionados conforme os regulamentos mais actuais, tiveram de ser demolidos, pois os danos não estruturais tornavam economicamente inviável a sua reparação. A partir da constatação in loco do bom comportamento dos edifícios que tinham sido projectados com o sistema de isolamento de base, a utilização deste sistema em edifícios públicos e privados cresceu exponencialmente em países com risco sísmico elevado.

Os dispositivos utilizados num sistema de isolamento de base devem obedecer às seguintes características:

  1. Capacidade de suporte das cargas verticais, grande rigidez vertical
  2. Baixa rigidez horizontal
  3. Capacidade de dissipação de energia
  4. Capacidade de restituição à posição inicial após o sismo

Os dispositivos mais utilizados num sistema de isolamento de base são:

  1. Aparelhos de apoio elastoméricos com grande capacidade de dissipação de energia (HDRB)
  2. Aparelhos de apoio elastoméricos com núcleo de chumbo (LRB)
  3. Aparelhos de apoio metálicos de superfície curva (Friction Pendules)

Resumidamente, poderemos dizer que o isolamento de base apresenta imensas vantagens sobre a protecção sísmica convencional, dado que no sistema convencional, a limitação dos danos obriga a que os deslocamentos entre pisos (drift) sejam reduzidos e, por consequência, é necessário utilizar estruturas e fundações robustas. Por outro lado, uma vez que o isolamento de base consiste fundamentalmente na redução da acção sísmica aplicada à estrutura, o seu dimensionamento poderá ser feito em regime elástico, com a redução das dimensões de vigas, pilares e fundações e consequente diminuição dos custos da estrutura.

Além da redução do custo da estrutura, a eliminação de danos não estruturais poderá conduzir a uma redução no custo dos seguros. No Japão, principalmente, já é comum os proprietários dos edifícios não terem seguro contra sismos, pois o custo dos danos que porventura ocorram é inferior à franquia cobrada pelas seguradoras. Na maioria dos casos, o custo do seguro de edifícios com isolamento de base é muito inferior ao do seguro dos edifícios construídos de acordo com o sistema convencional de protecção sísmica.

Se desde o início do projecto de um edifício for decidido utilizar um sistema de isolamento de base, o custo desse isolamento não ultrapassa o valor de 1 a 2 por cento do valor total do empreendimento. No caso de hospitais, onde o custo dos equipamentos se aproxima de 50 por cento do valor total do empreendimento, esse valor poderá ainda ser inferior. No Hospital da Luz, o único com isolamento de base em Portugal, o custo do isolamento de base foi de 0,8 por cento do valor total do empreendimento.

Em países com grande actividade sísmica, tais como Japão, Turquia, Chile, México, Irão, Peru, Itália e outros, já não é permitido construir os novos hospitais sem a utilização do sistema de isolamento de base.

A Organização Mundial de Saúde, nos seus 10 princípios básicos para a construção de hospitais seguros, termina por afirmar:

O HOSPITAL MAIS CARO É O QUE FALHA

Francisco Lourenço Pimenta – Engº. Civil (UP) , Msc (Imperial College)

(Francisco Lourenço Pimenta escreve de acordo com a antiga ortografia)

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