Health Parliament Portugal apresenta livro para melhorar Saúde Pública

  • 02 novembro 2017, quinta-feira
  • Gestão

Texto e fotografia por Carlos Alberto Costa

O Ministro da Saúde encontrou a fórmula perfeita para enquadrar o trabalho do Health Parliament Portugal, uma réplica parlamentar formada por jovens deputados entre os 21 e os 40 anos que produziram 58 recomendações para melhorar a saúde pública em Portugal.

“Vai ser um grande privilégio ter-vos como consultores informais do ministério para as políticas públicas de saúde, envolvendo os nossos dirigentes e os nossos curadores”. As palavras do ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, na apresentação pública do livro “Recomendações para o Futuro da Saúde”, reforçam a abertura política para implementar no SNS as recomendações do Health Parliament Portugal, um projeto que replica um parlamento convencional e que no último ano fez o diagnóstico do setor da Saúde em Portugal e produziu recomendações para o melhorar.

O livro apresentado dia 20 numa sessão pública que decorreu na sede do Infarmed, em Lisboa, reúne 58 recomendações geradas por seis comissões de trabalho (barreiras aos cuidados de saúde; economia do conhecimento; ética em saúde; o doente no centro da decisão; saúde mental e tecnologias de informação em saúde), apoiadas por um conselho consultivo e por um grupo de curadores que inclui, entre outras personalidades, dois ex-ministros da Saúde, Paulo Macedo e Maria de Belém Roseira, o antigo Diretor-Geral da Saúde, Constantino Sakellarides, e o antigo presidente da Gulbenkian, Artur Santos Silva.

A referência ao “custo zero”, acentuando o modus cívico do projeto, tinha sido feita pela presidente do Infarmed logo na abertura da sessão. Dirigindo-se em particular aos parlamentares presentes, Maria do Céu Machado valorizou “o envolvimento das gerações mais novas na conceção de rumos para o futuro da Saúde”, mas pediu medida certa para o entusiasmo e sugeriu que as abordagens do Parlamento da Saúde fossem futuramente enriquecidas com o papel do cidadão nos diversos níveis de envolvimento possíveis. 

“O repto é: continuem a pensar, a refletir, a publicar, a ajudar o senhor ministro da Saúde a custo zero, mas não sejam demasiado jovens no sentido de que os jovens só gostam de olhar para a frente, olhem para o futuro mas vejam também o que tem sido feito. Nós portugueses temos a tendência de pensarmos que estamos sempre a inovar, esquecendo que há situações que já foram pensadas e por algum motivo não foram desenvolvidas. Li as conclusões mas gostaria de as ter visto ordenadas pelo nível a que depois podem ser implementadas. Discutimos muito o futuro e a organização e o que pode melhorar, mas não o papel de cada um de nós. Por vezes, as conclusões são muito orientadas para a tutela, para o que o ministério ou as instituições oficiais devem, ou podem, fazer. Cada um de nós tem uma função que pode exercer onde está, onde trabalha, ou como cidadão comum ou ligado a alguma instituição. Portanto, gostava de ter visto equacionado e debatido o papel do próprio cidadão. Há aqui vários níveis de envolvimento e responsabilidade e acho que podiam avançar nas próximas reflexões no sentido de nos recomendar ou concluir qual o papel de cada um de nós nos vários níveis em que nos posicionamos”, referiu a presidente do Infarmed.

O ministro discordou do reparo sobre o “excesso de juventude” e recomendou ousadia, lembrando que “o facto de o ‘retrovisor’ dos jovens permitir ver pouco é uma vantagem competitiva, porque os torna saudavelmente mais imprudentes ou até ousados e atrevidos.”

“É desta mistura entre o atrevimento, a ousadia e a imprudência, e aquilo que por vezes é a ponderação excessiva dos mais velhos, que resultará uma grande trabalho em conjunto no âmbito deste Parlamento da Saúde”, enfatizou o ministro.

Para reforçar a filosofia inter-geracional associada ao projeto, Adalberto Campos Fernandes recorreu mesmo a uma analogia com o futebol que arrancou sorrisos na sala: “As equipas de sucesso têm sempre um defesa central com 33 anos e um guarda-redes com, pelo menos, 38…e eu sei do que estou a falar, porque sou adepto do Benfica…”

O dever cívico

Ana Castro, presidente do Health Parliament Portugal, disse à Tecnohospital que “as expectativas em relação ao projeto foram além do previsto.”

“O nosso objetivo inicial era que, pelo menos, uma das nossas recomendações pudesse ser implementada, mas na realidade já há mais recomendações postas em prática e algumas comissões estiveram a trabalhar com o Ministério, nomeadamente no projeto SNS +proximidade.  Isto já é uma vantagem, não é só um livro que vamos pôr na prateleira”, explicou a investigadora e oncologista do Centro Hospitalar do Porto.

“Vamos ter uma segunda fase que é de desenvolvimento e implementação destas políticas, algumas mais académicas, outras mais de implementação no terreno, e acho que vai ser possível a curto/médio prazo conseguirmos que sejam uma realidade no SNS [Serviço Nacional de Saúde], para o melhorarmos, que foi sempre esse o propósito de toda a gente que cá esteve”, acrescentou Ana Castro.

Questionada sobre a abertura política do Ministério da Saúde para o trabalho do Parlamento da Saúde, Ana Castro revelou que os contactos vão ser aprofundados com contactos mensais regulares.

“Antes da sessão pública de apresentação do livro estivemos com o senhor ministro numa reunião de trabalho à porta fechada em que ficou acordado que vamos ter um encontro mensal para podermos ir fazendo o acompanhamento destas políticas e da implementação das mesmas, pelo menos das que puderem ser aplicadas”, explicou a presidente.

Sobre o futuro do Health Parliament Portugal, Ana Castro admite continuar ainda no próximo ano, abrangendo a fase da implementação de medidas e a avaliação do sucesso das mesmas.

“A lógica será trabalhar não só com o Governo, que é quem pode implementar as medidas, mas depois com a Assembleia da República, que no fundo é a responsável por ver se elas estão a ser compridas. Talvez com a assembleia também possamos ter um papel importante para trabalhar em conjunto. Acho que não há nenhum impedimento para isso. Estou otimista. Este foi um ano bem empregue, achamos sempre que as coisas estão mal mas as pessoas não se levantam do sofá para contribuir. Este foi o nosso dever cívico de ajudar e é isso que estamos aqui a fazer, tivemos voz e fomos ouvidos”, conclui a presidente do Health Parliament Portugal.

Recomendações e práticas

Aumentar a capacidade resolutiva dos cuidados de saúde primários, consciencializar os utentes para utilizarem melhor os recursos disponíveis, melhorar a integração e interligação de cuidados continuados integrados, criar um demonstrador de inovação no SNS, avaliar o impacto do financiamento hospitalar baseado em resultados relevantes para o doente, atribuir a titularidade e a custódia dos dados de saúde a uma entidade executora, criar o registo único e a figura do gestor de percurso do doente estão entre as quase seis dezenas de recomendações geradas pelas seis comissões de trabalho no âmbito do Health Parliament Portugal.

No caso da comissão “Barreiras aos Cuidados de Saúde”, a colaboração com a tutela está numa fase mais avançada, pois já integra o projeto +SNS proximidade, desenvolvido pelo Ministério da Saúde para permitir que alguns exames e tratamentos sejam disponibilizados nos centros de saúde, diminuindo assim as idas à Urgência e os episódios de internamento.

Inspirado na figura de Barack Obama, o ex-presidente norte-americano que tornou inclusivo o sistema de saúde do seu país, o Health Parliament Portugal é formado por 60 “parlamentares” entre os 21 e os 40 anos, oriundos de diferentes origens académicas e profissionais.

Fruto de uma parceria entre a Janssen, que pertence ao grupo farmacêutico Johnson & Johnson, a Microsoft, a Universidade Nova de Lisboa e o semanário Expresso, o projeto chegou a Portugal em 2016, depois do Parlamento Europeu, em Bruxelas, e do Reino Unido. A primeira sessão plenária teve lugar já este ano, a que se seguiu o “trabalho de campo” com visitas a hospitais, centros de investigação e entidades relacionadas com o setor da Saúde, contactos com ordens profissionais, organismos públicos, associações de doentes e profissionais de vários setores de atividade, da Saúde à Economia.

As propostas agora plasmadas em livro foram colocadas a apreciação e votação no final de maio último, e em junho foram apresentadas numa cerimónia que decorreu no Palácio da Ajuda, em Lisboa, na mesma sala onde habitualmente tomam posse os membros do governo da República.

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