Entrevista a Francisco George, Diretor-Geral da Saúde

  • 01 março 2017, quarta-feira
  • Gestão

Francisco George aborda, nesta entrevista, a génese de problemas de Saúde Pública como o Zika e o Ébola, retomando também o surto de legionella que assolou Vila Franca de Xira. Não são deixadas de lado outras questões como o papel da engenharia na prevenção de problemas de Saúde Pública ou a evolução da Saúde em Portugal.

Os países africanos têm-nos trazido alguns perigos de algumas epidemias/pandemias, etc., nomeadamente com o Zika e o Ébola. Qual a razão?

No que respeita à flora e à fauna, ainda há muita natureza por explorar nesses países, natureza essa que ainda não recebeu construções urbanas. Há muitos animais selvagens e muitos agentes infecciosos que circulam primeiro numa fase animal, sob a forma epizoótica, seguindo-se um salto de barreira de espécie. Aí, surgem problemas de saúde pública humana que são, alguns deles, muito preocupantes, como aconteceu com a SIDA e outras doenças, muitas delas com origem nos macacos. É o problema do Zika, foi o problema do Ébola e foi o problema da Febre Amarela. Além de a circulação ocorrer primeiro entre macacos, há que considerar a grande proximidade dos macacos ao homem. Em muitos desses países o macaco também é fonte alimentar, até por haver mais dificuldade em encontrar bovinos devido à tripanossomíase. Há também um problema muito grande de falta de infraestruturas, não só no que diz respeito ao saneamento no meio ambiente mas também às infraestruturas sanitárias: centros de saúde, hospitais, pessoal de saúde, medicamentos, distribuição, etc. Trata-se de falhas imensas que os colonizadores deixaram e que até ao momento não foram reparadas. Viver num país africano é muito diferente de viver num país europeu. As condições são perfeitamente distintas, o acesso aos serviços públicos é muito diferente e o saneamento básico é muito distinto.

Há alguma questão com que se tenha deparado na sua carreira e que lhe pareça particularmente relevante para a área da engenharia?

É necessário os engenheiros construírem as infraestruturas em falta. Esses países, em matéria de infraestruturas, estão muito fragilizados, como sublinhei. É preciso reconstruir tudo. É preciso ter em conta que há processos que têm de ser simplificados, nomeadamente no que respeita ao abastecimento de água e à transformação da água em termos de potabilidade. Também o problema do tratamento dos resíduos tem de ser resolvido. O saber dos engenheiros, que é inquestionável, não tem tido aplicabilidade naqueles países, e isso tem sido um grande problema até hoje…

Por razões que não têm nada a ver com os engenheiros…

Têm, de certa forma, a ver com os engenheiros – ao planificarem, planearem e desenharem – devem ter em conta as condições locais.

Referia-me às condições políticas…

Está tudo relacionado. Ao longo de mais de 400 anos, sobretudo nos países que não foram colonizados, as riquezas naturais foram extraídas e depois não houve investimento em termos de desenvolvimento. Na Guiné-Bissau não havia um serviço de saúde e o serviço de educação era assegurado pelas mulheres dos militares. Quando os militares saíram acabou tudo em termos de administração do Estado. E o mesmo aconteceu em relação aos franceses na Guiné-Conacri, por exemplo.

A Administração portuguesa na Guiné-Bissau era uma administração militar e, naturalmente, quando os portugueses saem, há uma ausência total de administração em termos de funcionários públicos e de organização do Estado. Não poderíamos ter uma “explosão” de Ébola num país com infraestruturas, com serviços de saúde organizados. O problema emerge primeiro numa comunidade e, depois, aqueles que adoecem vão à procura de cuidados médicos. Na ausência desses cuidados no interior, a procura dirige-se para os grandes centros, que também não têm condições. Assim se deu origem a esta terrível epidemia que pôs o mundo em alerta, e naturalmente outros problemas estão agora a ser identificados.

A questão do Zika está mais ligada à América Latina porque é aí que existem as populações de mosquitos-vetores específicos para o Zika, que são as mesmas do Dengue. Portanto, os países da América Latina que estavam confrontados com o Dengue agora passaram a estar confrontados com o Zika que, ao que tudo indica, tem aspetos muito preocupantes.

Para além do surto de legionella que surgiu em Vila Franca de Xira, nas torres de arrefecimento, e em que a DGS teve uma atuação reconhecidamente positiva, deparámo-nos recentemente com um problema no hospital de Peso da Régua.

Isso é um problema distinto. O problema da identificação da bactéria na água na rede predial, seja de um hospital ou seja de um serviço público ou um grande escritório de um centro comercial, seja onde for, a presença da bactéria numa rede de água predial representa um risco mas não é um problema de saúde pública, é um problema ambiental, portanto tem de ser resolvido antes de provocar problemas em saúde pública. Nós tivemos na Régua uma situação de identificação de colónias da bactéria mas sem provocar problemas de saúde pública humana. E isso faz toda a diferença, tanto que as colonizações de legionella nos hospitais, que são frequentes (agora têm sido mais noticiadas), podem estar na origem de clusters de 1, 2, 4, 5 casos num hospital, e quando se verifica que assim é tomam-se medidas adequadas para evitar mais problemas e isso não aconteceu na Régua.

Existe algum tipo de manutenção preventiva que os hospitais possam fazer?

Pois aí é que está. Os engenheiros têm de tratar das instalações. Têm de assegurar que a água tem origem municipal. Não pode ter origem em furos nem em água de superfície, que é mais barata em termos de captação mas oferece mais riscos. A bactéria convive mal com o cloro, portanto as redes municipais que têm cloro estão bem, em geral. A bactéria é aquática, portanto é natural que as captações de um rio, de um lago ou outro local que não passe por um tratamento de cloro tenham a bactéria. Depois, as redes prediais podem não estar em condições ou ter, por exemplo, incrustações devido à falta de manutenção. As bactérias aí alojadas formam colónias – os chamados biofilmes – que podem estar na origem de infeções, nomeadamente respiratórias. Quando estes problemas são identificados tomam-se imediatamente medidas, mas o ideal será que os serviços de manutenção não permitam chegar a esta fase. Nas torres de arrefecimento é igual. A Saúde Pública não tem de se preocupar com a manutenção das redes nem se as torres do centro A, B ou C estão ou não devidamente vigiadas em termos de manutenção. Essa não é a nossa questão, isso é da competência dos proprietários, daqueles que são os gestores desses estabelecimentos. Agora, é preciso que as administrações encarem os serviços de manutenção como indispensáveis. A haver poupança, não deve ser em matéria de manutenção.

Referiu a existência de incrustações e, como sabemos, nos hospitais as torres de arrefecimento são proibidas. O que existe, com frequência, são redes de águas com muitos anos, especialmente nos hospitais mais antigos, com incrustações enormes. Relativamente a isso, a única solução é mesmo a substituição das tubagens. Considera, portanto, que essa é uma das situações mais preocupantes nos hospitais?

Conheço exemplos deste tipo: uma obra está pronta para ser entregue e a rede predial fica alimentada por um furo fora da rede. Dá-se um processo de colonização, sobretudo nas juntas e nas partes mais favoráveis a formarem-se colónias das bactérias e depois há um processo de erosão, conjugado com outros fatores, que permite a formação de biofilmes muito difíceis de eliminar. Normalmente, aquilo que os engenheiros fazem, antes de mais nada, é tentar a eliminação das colónias através de um choque de calor, mas para isso é preciso que a rede suporte esse calor. As bactérias são sensíveis acima dos 60 graus e são também sensíveis a choques de cloro, mas para um e para outro é preciso que as redes possam suportar esses tratamentos e muitas vezes não é isso que acontece.

As redes muito velhas têm grandes quantidades de incrustações…

FG: É um problema, reconhecidamente. É preciso manter sempre o cloro a níveis relativamente altos. Aliás, há novos equipamentos, muito eficazes, que injetam cloro nos sistemas sob várias formas, incluindo gás. Também é preciso mudar com frequência os telefones dos chuveiros e as torneiras que fazem pressão, uma vez que a bactéria, para provocar a doença, tem de ser inalada e não bebida, pelo que a formação de aerossóis através da pressão pode ser evitada também mudando as torneiras, evitando a pressão e tendo em atenção os chuveiros, igualmente.

O caso de Vila Franca de Xira foi considerado um dos casos mais extensos em todo o mundo…

Tivemos 4001 casos registados, 366 dos quais resultaram em internamentos, muitos deles em cuidados intensivos. Houve pneumonias graves e 14 mortes. O parque hospitalar da região de Lisboa respondeu muito bem e foi possível, rapidamente, identificar a fonte. Foi possível, ao fim de algum trabalho e com recurso a vários especialistas, desde o ambiente à meteorologia, fazer modelos de propagação em função dos ventos predominantes. Percebeu-se que era um problema da área exterior logo pela dimensão, mas também havia casos devidos a inalação em ambiente interior. Foi possível encontrar a fonte da infeção com um concurso harmonioso de diferentes especialistas, incluindo engenheiros. Tivemos sempre o departamento de engenharia da DGS mobilizado 24 horas. Foi um trabalho eficaz mas é um problema que não devia ter acontecido se os serviços de manutenção tivessem estado a funcionar adequadamente. Pelos vistos isso não aconteceu, uma vez que a torre deu origem a emissão.

Foram várias torres?

Foi, sobretudo, uma torre.

Referiu que também haveria uma origem interior…

Sim, uma exposição ocupacional igualmente, o que se compreende já que se tratava de uma fábrica, pelo que houve exposição ocupacional e exposição da própria empresa.

A DGS tem uma equipa de engenharia. Para quem está de fora, parece ser uma equipa muito reduzida, mas que pelos vistos tem capacidade…

Isso acontece com todas as unidades e departamentos. Nós somos, em termos numéricos, muito reduzidos. Quando eu comecei aqui éramos 320, agora somos 150. No entanto, produzimos muito melhor e muito mais. A equipa é suficiente, são pessoas muito bem formadas, com conhecimentos muito afinados. Podíamos ser mais mas damos as respostas necessárias.

Quantas pessoas estão ligadas à divisão de Saúde Ambiental?

 Não serão mais de 20 mas são pessoas muito experimentadas. São jovens, todos eles muito bem formados, com pós-graduações em várias áreas e, no conjunto, o departamento de Saúde Ambiental dá respostas.

Os licenciamentos também passam por aqui?

Tudo o que carece de licenciamento, nomeadamente os biocidas e radiações. A exposição às radiações ionizantes é aqui regulada, e a colocação no mercado de biocidas também.

Em termos de radiações e de licenciamentos, ainda não há muitos anos havia atrasos preocupantes nos hospitais.

Os atrasos têm sobretudo a ver com a componente inspetiva, que é reduzida e que tem uma lista de espera em termos de respostas…

Está a falar do ITN…

Estou a falar do atual Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa, que é a antiga Junta de Energia Nuclear, que passou a Instituto Tecnológico Nuclear e agora está integrado no Técnico. Há respostas que só eles podem dar, nomeadamente as chamadas vistorias e auditorias. Só damos licenças de funcionamento perante a comprovação e a certificação das condições de operacionalidade emitidas pelo IST.

Houve, até agora, uma certa falta de separação de fronteiras entre quem desenha instalações, quem as instala e quem avalia e, naturalmente, tivemos de por fim a este sistema, todo ele ligado à mesma instituição, pelo que teve de ser assegurada a separação de instituições. Por vezes, até se chegava ao ponto de ser a própria entidade que montava a inspecionar. Desenhava, montava, inspecionava, auditava e certificava. Agora temos uma boa colaboração, cada um faz o seu trabalho.

Em termos de serviços públicos chegou a haver prejuízos muito grandes nas instalações.

É natural. Sobretudo antes do ministro Mariano Gago, havia muito pouco investimento na ciência e na tecnologia. Foi com ele que começámos a separar as águas, e trabalhámos muito em conjunto sobre esta questão. Há uma era antes e depois de Mariano Gago, na área dos equipamentos pesados.

Além da divisão de engenharia, quais são as outras divisões da DGS?

A DGS tem quatro grandes pilares: Qualidade, que emite as orientações clínicas e as normas e conduz o programa geral de acreditação; Prevenção e Gestão da Doença; Informação e sua Análise e Internacional. Esta última está ligada, em permanência, não só às comissões no contexto da UE como também à Organização Mundial da Saúde. Por esta via se traz para Portugal tudo o que se refere a ambiente internacional e se leva para lá as questões aqui identificadas e analisadas.

Voltando ainda ao caso da legionella, recentemente foi divulgado um estudo que revela a possibilidade de ter havido um caso de transmissão pessoa a pessoa, e não apenas através de gotículas.

Isto foi possível identificar em Vila Franca de Xira, logo no segundo mês de trabalho, devido a um fenómeno comparável ao das ervilheiras de Mendel. Há um surto que relaciona, no espaço e no tempo, muitos casos, todos com a mesma origem. Isto permite estudar a fonte da infeção, o que não aconteceria com 10 a 15 casos. Estamos a falar de 400, havendo um caso de um familiar que não esteve em Vila Franca de Xira e adquiriu a infeção através do filho. Foi estudada a composição da própria bactéria e percebeu-se que era a mesma. É natural que assim tenha acontecido mas esta não é a via principal. A via principal é a inalação de partículas de aerossóis contaminadas com a bactéria.

Mas aparentemente era impossível…

Não estava descrito. Também nunca tinha havido um surto com a dimensão de 400 casos. Em duas semanas ter 400 casos bem estudados, à lupa, um a um, em hospitais modernos, com todas as condições laboratoriais, com o Instituto Ricardo Jorge a fazer tipagens, sequenciação dos genomas, era algo que não acontecia no passado. A resposta que foi dada, reconhecidamente, tem também a ver com as condições de grande qualidade de todos os que se juntaram, nomeadamente a parte laboratorial do Instituto Ricardo Jorge.

Admitindo que a sua candidatura ao Conselho Executivo da OMS tem sucesso [o nome do diretor-geral de Saúde foi indicado pelos Ministérios da Saúde e Negócios Estrangeiros para representar Portugal], isso vai colidir com as suas funções?

Não, não vai colidir. Normalmente o Conselho Executivo tem quatro a cinco reuniões por ano, cada uma delas com a duração de cinco dias úteis, e os membros do Conselho recebem documentação para participarem e para conduzirem a organização. É o Conselho Executivo que conduz a organização, em termos de gestão, administração, orçamento, plano de atividades e programas de trabalho. Isso é feito, hoje, de forma mais fácil. No passado era com documentação escrita, agora é tudo paper free. É possível conjugar, até porque a DGS conduz os mesmos programas da OMS a nível nacional. São temas que nós conhecemos e com os quais lidamos todos os dias. O cargo tem interesse porque projeta, em termos internacionais, os avanços de Portugal, o que dá contributos muito interessantes em termos de saúde global. Nós hoje alcançámos, em muitas áreas, patamares de qualidade que não existem noutros países. O sistema de notificação de doenças, chamado SINAVE, é um exemplo. Temos também a certificação de óbitos, totalmente baseada numa plataforma da Internet. Entrando no site da DGS é possível ver quantas pessoas morreram até ao momento, como morreram e que idade tinha. É um contador automático. Até há pouco tempo, para sabermos esses dados tínhamos de esperar dois anos pelo circuito todo. Há muitos países que têm vindo a Portugal ver o sistema, outros têm-nos convidado e outros querem adquiri-lo. Há também o receituário eletrónico e a conferência de faturas. Com todo este mundo de eHealth conseguimos ultrapassar os atrasos que tínhamos. Poucos países estão tão bem equipados neste domínio como nós. E isso, naturalmente, são exemplos de conquistas que não devem ficar entre nós. Através do Conselho Executivo, perante a discussão deste ou daquele problema, Portugal tem sempre uma palavra.

Este ano vamos começar com um sistema absolutamente inovador, que é a colocação automática numa plataforma dos resultados dos laboratórios clínicos. Os laboratórios de patologia clínica passam, automaticamente, a colocar os resultados e nós passamos a saber, por exemplo, quantas análises positivas houve para esta ou aquela condição. Foram desenhados aqui modelos de eHealth únicos em todo o mundo, tudo por engenheiros portugueses. Quando o certificado de óbito é submetido pelo médico, segue 7 caminhos, desde o registo de utentes até à justiça, passando pelas polícias, Ministério Público, DGS e IRN. É um processo instantâneo, mas cada entidade recebe apenas a informação de que precisa. Será que o IRN precisa de saber que aquela pessoa morreu com SIDA? Não precisa, mas a DGS precisa. O INE não precisa de saber o nome daqueles que morrem mas precisa de saber a idade. Portanto, há filtros nesse sistema que são ímpares, que os engenheiros informáticos portugueses conseguiram montar. A equipa da DGS que se ocupa destes processos é constituída por três pessoas, que têm mais que fazer além disto. E com isto fazemos trabalho mais depressa, melhor e de forma mais segura.

Na sequência da reforma para a Saúde Pública, foi criada uma task force. O que se espera desta estrutura?

Vai haver uma renovação e uma reorientação no sentido ligado à importância e ao reconhecimento do papel que a literacia representa para a Saúde dos cidadãos e das famílias. Trata-se de promover a literacia e gerir bem a doença, quer as doenças transmissíveis quer as doenças crónicas, com coordenações estratégicas muito fortes e com diretores muito bem aceites pelos pares, que detêm mais competências, mais poderes, mais autonomia, nesta perspetiva de conseguirmos reduzir a mortalidade antes de tempo, que é aquela que ocorre antes dos 70 anos. Mais portugueses têm de festejar 70 anos e mais portugueses têm de viver sem deficiência. O nosso objetivo é duplo: reduzir a mortalidade antes de tempo e fazer com que os portugueses vivam anos com mais saúde e menos deficiência. Esse é o nosso trabalho.

O DR. Francisco George é médico desde 1973, portanto tem a noção perfeita da evolução que houve em Portugal. Nós consideramos que temos um bom SNS.

Excelente. Eu conheço-o bem, era médico quando ele foi criado, e trabalhei desde o início com o Dr. Arnaut. Na altura, estava no concelho de Beja, que era piloto para o SNS, e convivi de perto com ele. Testemunho que foi um passo que permitiu a Portugal recuperar atrasos notórios. Teve muitos dirigentes de grande classe. Albino Aroso terá sido um dos maiores mas houve muitos outros. As mulheres portuguesas devem muito a Albino Aroso, mais do que se possa pensar.

No exterior é reconhecida essa evolução de Portugal?

É. Sobretudo a aceleração e, a par da aceleração, a uniformidade da cobertura. Não há grandes diferenças entre taxa de mortalidade infantil em Bragança ou em Lisboa. Em Março de 2016 já se sabia que a mortalidade infantil continuava abaixo dos 3 por mil, situações que só se verificam em muito poucos países.

Depois desta conversa sobre o SNS, não resisto a perguntar-lhe se não está hoje preocupado com alguns retrocessos que aconteceram nos últimos 4 anos. Obviamente estou a referir-me à crise e à governação, até porque, referindo a área das engenharias, houve um desinvestimento tecnológico muito grande, que precisa de ser reposto rapidamente.

É verdade, estamos preocupados com isso. Essa questão tem a ver com os administradores, mas devo dizer que Paulo Macedo demonstrou que muitos desses problemas acontecem devido à fragilidades de líderes locais. As unidades têm de ser bem geridas e faz toda a diferença uma unidade bem gerida em relação a outra unidade com a mesma idade e os mesmos tipos de equipamentos e recursos mas mal gerida. Isto tem sobretudo a ver com a necessidade de colocar nas unidades pessoas com competência, pessoas absolutamente interessadas no serviço público e isso nem sempre tem acontecido.

Então pelo menos os grandes hospitais tiveram todos gente incompetente porque é uma desgraça em termos de investimento. Este ano, temos de dar um salto muito grande e se calhar nos próximos 2 ou 3 anos, para compensar a reposição do parque tecnológico que se degradou e que não foi reposto.

É isso que se está a fazer. O Dr. Adalberto conhece bem esse problema, e ninguém melhor do que ele estaria preparado para este lugar. Conhece muito bem o sistema, as condições e a forma de gerir. No entanto, há uma coisa que não depende dele e que tem a ver com o orçamento. O orçamento do país é uma manta curta, não é elástica.

Não é preciso ninguém fazer nada para degradar o SNS, basta deixar correr o tempo sem fazer o chamado investimento de substituição, para que isto caia, como tem vindo a cair nos últimos 4 anos.

Essa é uma questão que não queremos ignorar.

Francisco George é especialista em Saúde Pública. Passou pela Organização Mundial de Saúde, tendo trabalhado, sobretudo, em desenvolvimento de sistemas de saúde. Dedicou-se também ao estudo, controlo e prevenção da SIDA. Está na Direção-Geral de Saúde desde 2001, onde começou por se ocupar da divisão de Saúde Ambiental. Passou a subdiretor-geral, cargo que ocupou até 2005, tendo depois passado a diretor-geral.

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